domingo

- Já sei que me vais dizer que não queres saber...
- Então se o sabes, não o digas.
- Não sei se consigo... Sinto que devo dizer-te.
- Pára lá com o suspense. Ou dizes ou te calas de uma vez.
- Digo. Mas acho que não vais gostar...
- Então não digas. E também não fales mais sobre o assunto.
- Sabes de quem vou falar?
- Quase adivinho... E dispenso. Isso está morto e enterrado.
- Pois olha que de morto não tem nada.
- Não estou interessada, adiante.
- Não tens nem um pedacinho de curiosidade em saber?
- Não.
- Ora! Se não te conhecesse, chamava-te mentirosa.
- Não te atrevas!
- Calma! Estou a provocar-te! A ver se me deixas contar...
- Eu deixo, não te tapo a boca. Mas és capaz de ficar sózinho.
- Eu conto de uma vez e juro que depois não falo mais dele!
(Calo-me. Estou à espera)
- Posso? Posso mesmo? Tu deixaste!
(Continuo calada. O meu amigo gay adora estes bocadinhos. Avanços e recuos)
- Era Ladies Night. Sabes como gosto de aparecer nestes dias! Os homens lindos parecem que nascem debaixo das pedras da calçada! Dizem-se hetero...
- Não divagues. Já sei do que gostas.
- Que chata! Nem me deixas dar ambiente à coisa!
- Pára com a bichisse e vai directo ao assunto. Começas a irritar-me...
- Pronto, pronto!
(Será que é agora que desembucha de uma vez?!)
- Estou eu no bar e entra ele...
- E depois? Que é que isso tem?
- De mão dada com uma criaturinha!
- Uma loira pintada, com tiques de tia? Já conheço, até fomos apresentadas.
- Não, não! Uma morena! Lindíssima! Se eu gostasse não me escapava!
- Não sei quem é.
- Pois é isso mesmo! Aquilo é carne fresca!
- Bom... e que é que isso tem de tão extraordinário? O lugar é público, ele livre.
- Não por muito tempo!
(Abre muito os olhos, aperta os lábios. Está doido para que eu lhe faça perguntas.)
- Não dizes nada?
- Que queres que diga? Eu não estava lá, a história é tua.
- Minha não! Deles! Do casal-maravilha! Parece que vão dar o nó!
- Ai sim?
- Ele não se deve lembrar de mim... Afinal cruzámo-nos, o quê? Duas, três vezes?! Quando foi ao bar ouvi perfeitamente um fulano que lá estava perguntar-lhe quando sería o casório. Ele até se riu! É para breve, disse ele, para breve. Estás a ouvir? Para breve!
(Acho que não percebi o que ele me disse... Porque é que ele está tão longe? Quase nem o ouço, vejo a boca dele a abrir e fechar como se tentasse dizer-me alguma coisa mas não ouço, não ouço, não ouço nada...)
-Edna? Tu estás a ouvir-me? Não me assustes! Ai, minha Nossa Senhora! Estás a sangrar tanto!

Sem comentários: