sábado

Conversa de caminho até casa, ontem:
- Se quiser venho buscá-la, podemos dar um passeio...
- Pelo jardim? Pela cidade?
- Por que não?! Se lhe apetecer! Estou por sua conta!
- Ai, que bom... Mas tenho que pedir-lhe uma coisa...
- Diga, diga, o que estiver ao meu alcance...
- Edna!
- Que foi Mãe? Estou a falar com o Magalhães!
- Eu conheço bem esse tom...
- Ora! Sabe o que é Magalhães?
- Diga.
- Não se esqueça das fraldas.
- Das fraldas? Não estou a perceber!
- Vá à merda! Acha que eu estou senil? Que sou uma reformada desdentada a quem se leva a passear ao fim de semana ao jardim?!
- Eu sabía!
- Tu não sabías nada Mãe! Tu não sabes de nada! Pare o carro Magalhães! Pare o carro ou juro que me atiro!
- Está doida?! Ainda temos um acidente! E largue o volante! Deixe!
- Edna! Ai, Deus nos acuda a todos e salve!
- Bem podes gritar pelo teu deus que eu não largo o volante! Pare o carro seu idiota!
- Vamos bater...
Lembro-me do berro da minha Mãe. Como aquilo me entrou no cérebro e me feriu como uma broca. Depois um silêncio. E ao mesmo tempo um zumbido. Tudo branco à minha volta. Sózinha. E de repente senti uma chapada na cara. Parecía uma coisa molhada e ao mesmo tempo a arder-me na face. Voltei a vê-los.
- Juro por Deus que se você voltar a fazer o que fez lhe dou um ensaio que nunca mais se esquece! Não me fico só pelo estalo!
Juro que não me lembro o que é que se passou para me pôr assim. Foi uma coisa que me cavalgou, trotou por cima de mim, espezinhou-me.
Mas agora vejo tudo tão mais nitido, mais limpo.

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