terça-feira

Falemos de mim, então.
Desta incompreensão pelo mundo feminino e dos seus achaques.
Eu não devo ser mulher, no sentido literal da palavra. Não me falta feminilidade nem desejo pelo oposto, mas desajusto-me no conceito literário do choro e da recriminação, da vingança comezinha e do apogeu da galinhice e no fundo sinto vergonha por elas quando vejo algumas cenas ridiculamente infelizes e pequenas.
Falemos de mim, pois, e deste falo interior que cada vez mais cresce e até excito e tantas vezes exibo na diferenciação "delas".
Sei o que ele me vai referir. Subtilmente. Achará que me ofendo por me dizer que sofro da ausência de pénis pela ausência da figura paterna, uma amputação que me encaminha para o desprezo pelas mulheres.
Não é isso, mas também não me encaixo. Sinto-me fora e até perco o equilibrio naquele universo de crónica feminina, não sei o que hei-de dizer, desconheço os bordados, não experimentei as dores do parto, não me despeitei por rivais e tão pouco corri atrás do homem que amei.
Toma notas, não pára de escrever... isso não me perturba, quase adivinho a sua letra minúscula parecida com arame farpado, um propósito que só ele conhece não vá a paciente apanhá-lo desprevenido e desvendar-lhe a prescrição para a loucura.
Ele não me acha louca, mas crê que estou a um passo desse abismo.
... Se ele soubesse do meu saco do lixo...

Sem comentários: