Por falar em comida...
Nunca servi o pequeno-almoço a ninguém mas já mo serviram a mim. Umas quantas vezes. Inesquecível. Estava apaixonada.
Na verdade estava mais do que apaixonada, amei aquele homem até à dor.
Depois dele nunca mais ficou ninguém na minha cama até à hora do pequeno-almoço. Enxoto-os. Começo a pensar como serão de manhã: a barba crescida, mau hálito, remelas, devem fazer pontaria para urinar provocando aquele ruído irritante. Prefiro lembrá-los na frescura e depois, gosto de ter a cama toda só para mim.
Ele era diferente.
Até o som da respiração me agradava, fundo, uma paz, um verdadeiro descanso que me enchía o quarto. Muitas vezes acordava e ficava a ouvi-lo, a ver recortado na penumbra o peito a subir e descer. Eu pouco dormía, não quería perder um minuto que fosse daqueles momentos tão intimos em que se toca a vida ao nosso lado.
Pela manhã acordava-me silencioso, abría uma pequena fresta do cortinado, ajudava-me a encostar nas almofadas, passava-me um copo de sumo, o café com um cherinho que nunca mais senti... Não me beijava, compunha-me o cabelo de uma forma suave, olhava-me nos olhos, segurava o meu pescoço. Não me dizía nada.
E no entanto eu entendía que aquele tabuleiro de pequeno-almoço servido na cama era um carta de amor.
"As cartas de amor são ridiculas", dizía o Pessoa.
Pois são. E não perduram.
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