quinta-feira

Estava recostada no peito dele, os braços à volta da minha barriga, o queixo dele apoiado sobre o alto da minha cabeça. Cada vez que ele falava sentía as articulações a baterem-me na cabeça, parecía que as palavras entravam mais depressa e mais nítidas dentro do meu cérebro, na minha compreensão e tudo à volta era claro e sem barulhos e calmo e tranquilo nas cores pastéis que nos rodeavam.
Senti-me bem. Senti-me tão bem. Quase a flutuar, a boiar, muita água para não sentir o peso do corpo, do coração, das palavras que ele me dizía sobre a cabeça e que me íam enchendo, enchendo, enchendo.
De repente senti-me a estourar, um balão cheio que precisa de deitar fora o excesso ou sai disparado no descontrole contra paredes e mobilia.
Acordei. Estava toda molhada. Os lençóis, o colchão, a camisa de dormir da minha Mãe de pequeninas flores rosa empapada até à altura da barriga.
Quis levantar-me mas não consegui. Parecía paralizada no meio da urina e do cheiro acre que se desprendía.
Chamei a minha Mãe. Ela veio. Lavou-me, vestiu-me outra camisa das suas e depois deitou-me na sua cama. Eu recostei-me no peito dela e ela contou-me uma história de soldados, tal como eu lhe pedía para me contar quando era menina.
As palavras dela, muito baixas, entraram dentro da minha cabeça, devagar, tão devagar que adormeci e não sonhei mais.

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